A minha história com o Thiago tinha tudo para dar errado. Eu implicava com o coitado até dizer chega. Primeiro por ele ter acabado de completar 18 anos, ou seja, era um menino de quase 17, o que significava que além de bobão era só três anos mais velho que eu, e sempre gostei de caras mais velhos. Como se não bastasse, por causa do infeliz me vi na obrigação de de deixar de lado um dia de diversão com minhas melhores amigas para fazer um programa família com ele e meus pais.
Eu explico. O pobre coitado tinha acabado de voltar para o Rio depois de quase três anos no exterior. A minha mãe, que o considerava um sobrinho, quis mostrar a ele como estava a cidade tanto tempo depois, e me pediu para ir junto. Ela era amiga de infância da mãe dele, estudaram juntas desde pequenas e jamais perderam o contato. Sempre achei isso bacana, preservar amigos de colégio. As duas são como irmãs até hoje.
Eu e o Thiago nunca fomos muito chegados. Brincávamos quando nossas mães se visitavam, até nos divertíamos, mas era meio esquisito estar com ele. Não tínhamos os mesmos interesses, os mesmos papos. Um exemplo? Numa tarde chuvosa, ele me chamou em seu quarto para me mostrar uma "coisa rara". Fiquei curiosa e fui. O idiota tinha pousado uma meleca no papel higiênico para me mostrar como "melecas podem ser gigantes e assustadoras".
Éca-ti! Mil vezes éca-ti!
É por essas e outras coisas que não sei se quero ter filho homem.
A gente cresceu e ele continuou na dele, desengonçado, deslocado, tímido demais para o meu gosto. Sem molho, sem veneno, sem sal.
Deu para perceber que eu implicava mesmo com o bichinho, né?
Agora que você já sabe o meu grau de antipatia em relação ao Thiago, pode presumir que eu poderia ficar mais dois séculos e meio sem vê-lo que nem notaria sua ausência. E também pode entender claramente o quão irritada eu fiquei ao saber desse programa que me tomaria o dia inteiro.
Não estava com a menor vontade de sorrir para ele, de dar boas-vindas. Queria mesmo é ter coragem de me comportar como uma vaca durante todo o período em que eu estivesse com ele. Mas sempre fui boa filha, e a mamãe, uma fofa. Nunca me pedia nada. Por isso, decidi que tentaria parecer simpática, e riria das piadas sem graça ditas por ele. Essas coisas que a gente faz para viver pacificamente em sociedade.
Entrei no carro com a cara amarrada do meu lado avesso e a minha cara falsamente fofa e feliz do lado de fora. Partimos rumo ao Leblon, onde o chato, sem graça, sem alça, sem veneno e sem sal do Thiago morava.
Qual não foi minha surpresa ao ver Thiago!
Ele tinha se tornado um cara e tanto, com músculos em profusão, um cabelinho que era uma loucura, barbinha rala e sensacional por fazer, e a pele vermelhinha de sol. Era praticamente uma mistura de Brad Pitty e Caio castro. Não ... Bem melhor que isso.
Em dois segundos, girei meu rosto e pus sua melhor versão para fora: Um semblante muito, muito simpático mesmo, e um olhar pisca-pisca de libélula apaixonada. Quando ele abriu a boca, percebi que o Thiago que conheci criança tinha ficado no passado (yes, baby! Yesss!, comemorei). O Thiago era conversado, arriscava vez ou outra umas piadinhas verdadeiramente engraçadas, era espirituoso, cavalheiro (abriu a porta para mim e para minha mãe na saída do restaurante, very goooood!)
Ah! O menino era ou não era tudo na vida de uma pessoa? Era ou não era?
E pensar que passei algumas horas do dia chateadíssima, resmungando o martírio que seria sair com o cara. Tadinho!
Quando chegamos ao edificio em que ele morava com os pais, arrisquei:
▬ Você ja foi ao Jardim Botânico desde que voltou?
▬ Eu não vou ao Jardim Botânico desde que tenho 10 anos.
▬ Que vergonha, Thiago! - Exclamei, toda charmosa. ▬ O que você acha de ir comigo lá amanhã? Continua divino! É de chorar.
Marcamos.
No dia seguinte, acordei com uma vontade enorme de me sentir a menina mais linda do mundo. E nada melhor do que se sentir bonita por dentro para ficar bonita por fora. Claro que o que eu queria era que o Thiago me achasse a mais bela das belas. Joguei todas as roupas estilo piquenique em cima da cama. Além dos biquínis, claro. Afinal, já que íamos ao Jardim Botânico, porque não uma esticadinha até o Horto para um banho de cachoeira?
Até porque, não era dar muito mole chamar o cara para um banho de cachoeira numa tarde de quarta-feira, só nós dois, eu e ele, ele e eu, era?
Sim, era. Muito. Muito mesmo!
Ah, e daí? Estava disposta a ver até onde iria meu interesse por ele (e o dele por mim).
Marcamos no Jardim Botânico.
Quando cheguei, ele estava sentado numa mesinha bebendo um refrigerante e beliscando uns pães de queijo.
Lindoooooo!
Aproveitei a distração dele, cheguei por traz e tapei seus olhos. Contato físico nessas horas é importantíssimo. O cara sente seu cheiro, sua respiração... Aos 15 anos, eu achava que sabia tudo de conquista. E sabia mesmo! Porque não podia reclamar, os meninos gostavam da minha pessoa. E a minha pessoa gostava dos meninos. Nunca tive problema com o sexo oposto.
▬ Se você acertar quem é, ganha um beijo! – eu disse.
Nossa!, eu estava impossível mesmo!
▬ É a menina mais bonita da Barra?
Ooooowwwnnnn, fiz em pensamento.
Que menino fofo!
Passeamos pelo Jardim Botânico e falamos de tudo. Paramos. Sentamos num banquinho branco. Ele encostou no meu braço. Eu me aproximei dele. Ele aproximou-se de mim e botou as mãos na minha nuca.
Ui!
Que frio na barriga me deu nesse momento, você não pode imaginar.
Claro que você pode, como eu sou tolinha, rs
Nos beijamos, foi incrível. Nossas bocas se encaixaram com uma harmonia impressionante, que beirava a perfeição. Sem contar que o Thiago era exatamente o dicionário que define como carinhoso.
Com a cara mais sonsa do mundo, arrisquei:
▬ O que você acha de um banho de cachoeira antes de irmos para a casa?
Seu olhar hesitante quase me pregou uma peça, mas, para meu alívio, ele respondeu assim a minha proposta:
▬ Maravilha!
A água estava gelada, gelada daquela que endurece até os músculos quando a gente se molha. Não conseguia parar de olhar para ele, de fazer dengo pra ele. Suas covinhas, seu tom de voz, seu andar, tudo nele me atraía. Ele era inteligente, me fazia rir. Eu não planejava amar ninguém antes dos 18 anos!
Amar sem ser amada é a pior coisa do mundo desde que o mundo é mundo. Ainda mais quando você tem 15 anos. Mas não pense que num primeiro momento eu admiti de que amava o Thiago. Imagina! Para mim, inventei a mentira de que apenas gostava muito, muito do seu beijo e de sua beleza interior. E de que era bom, muito bom, ficar com ele e conversar com ele. E estar com ele. E rir com ele. Só isso!
▬ E aí, estão namorando? – Perguntou minha mãe pela milésima vez!
▬ Não, mãe! A gente só estar ficando!
Ficamos uns três, quatro meses cada vez mais juntos até nos declararmos perdidamente apaixonados, no dia do meu aniversário de 16 anos.
Éramos o retrato do casal feliz. Ele precisava do tempo que passou sozinho. Eu precisava amadurecer aquele sentimento estranho que me queimava a barriga e se chamava amor.
Em oito meses de namoro, nós não nos desgrudávamos, vivíamos juntos para cima e para baixo. Com ou sem amigos por perto, mas sempre unidos.
Marcamos de comemorar o nosso nono mês juntos no Jardim Botânico. Fomos ao parque e de lá rumo à cachoeira onde tudo começou. Como estava vazia, rolou ali mesmo nossa primeira vez, cercada de verde arbustos providenciais e muita paz.
Ninguém chegou, ninguém passou (se passou não fez barulho), nem os mosquitos atazanaram. Ficamos lindamente a sós, num momento que eu jamais vou esquecer, a água da cachoeira caindo, nossos corpos unidos num amor que eu jamais imaginei que conseguiria sentir, de tão grande e intenso...
Minha primeira vez foi extraordinária. Mais que isso. Tudo deu certo, a cumplicidade e o carinho eram tantos que parecia que fazíamos aquilo há anos. Thiago foi paciente, carinhoso, e eu nem fiquei nervosa. Foi natural como deve ser. Sem dor (quase), sem medo.
Ficamos juntos por mais 7 meses, depois que Thiago entrou na faculdade a relação começou a esfriar e o Thiago a se distanciar. Hoje, é com grande orgulho que digo que aquele amor enorme e com cara de eterno deu lugar a uma amizade maravilhosa.
Eu dou até conselhos amorosos para ele, que ficou ainda mais bonito com o passar dos anos e voltou a tomar gosto pela arte do beijar mulheres variadas. Ele diz que ainda sente ciúmes de mim e não é maduro o bastante para me dar dicas masculinas. Mesmo depois de tanto tempo, ainda existe uma bolsa de apostas que prevê a nossa volta. Já ensaiamos voltar algumas vezes, mas, na boa, acabou. O encantamento acabou. Terminamos sem mágoas, com o respeito intacto de um pelo outro.
O amor da minha vida virou “o” amigo da minha vida. E eu sou muito feliz com isso.
Mesmo porque estou conhecendo um carinha aí que ...
Ah! Deixa pra lá. Isso já é outra história, fica para um próximo texto. ;)
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